segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Portugal e Espanha a duas velocidades

Ele há coisas que nos deveriam fazer pensar.

Em Espanha, o PSOE, partido no Governo, continua a implementar um programa de fortes investimentos na Alta Velocidade. Apesar da crise, particularmente grave no país vizinho, ou precisamente por causa dela, diz Zapatero.

De resto, o programa de criação de uma rede ferroviária de Alta Velocidade em Espanha já vem de trás, do tempo do governo de José Maria Aznar, do PP. E continuará a ser uma prioridade, qualquer que seja o resultado das futuras eleições legislativas, a avaliar pelas declarações de há dias do actual líder do Partido Popular, agora na oposição.

Por cá, o partido que está na oposição, e que quando no Governo acertou com Espanha a rede das futuras ligações de AV, quer agora "riscar do mapa" o projecto. E o partido que está no Governo, e que na altura estava na oposição, faz da AV uma das suas bandeiras de campanha.

Quem quiser, que faça o favor de notar as diferenças.

Às tantas, é por estas e por outras que o fosso entre os dois países ibéricos se vai alargando.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Apoiar a Marcopolo ou os transportadores?

A Marcopolo, um dos maiores construtores nacionais (porque estabelecido em território português) de autocarros, está a dias de fechar as portas por falta de encomendas.

Num país onde a idade média dos autocarros privados anda pela casa dos 17 anos, não deixa de ser irónico que um construtor de autocarros (de carroçarias, bem entendido) feche por falta de encomendas.

Aliás, olhando para as estatísticas disponibilizadas pela Acap, o estranho é que os outros construtores ainda subsistam, quando a sua produção anual conjunta se conta por escassas dezenas de unidades.

A concessão de apoios do Estado é, ao que parece, uma das condições impostas por um investidor belga para se envolver na tentativa de manter em funcionamento a Marcopolo. Dada a actual conjuntura económica, social e política, é bem provável que o Governo aceite "abrir os cordões à bolsa" se o projecto do belga tiver pernas para andar, ou pelo menos mantiver os postos de trabalho no imediato.

Entretanto continua sem resposta a proposta há muito entregue pela Antrop, a associação dos transportadores rodoviários de pesados de passageiros, para a criação de um verdadeira programa de modernização da frota de autocarros nacional. Certamente, por falta de dinheiro.

E é aqui que reside a ironia suprema. O mesmo Estado que se nega (por acção ou omissão) a apoiar os empresários que estão dispostos a investir na compra de autocarros, estará, afinal, predisposto a apoiar um construtor dos ditos, que arrisca o fecho porque não tem encomendas...

A questão não é, afinal, escolher entre apoiar a Marcopolo (e as outras "Marcopolo" deste país) e apoiar os transportadores. Porque, na verdade, apoiando-se os transportadores estar-se-á a apoiar os construtores.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

A TAP está falida. E as outras?

Aí está um tema que eu bem gostaria de ver tratado nos debates eleitorais e, mais ainda, nos programas de Governo: os passivos acumulados das empresas públicas, e em particular das empresas de transportes.

De quando em vez, como agora com a TAP a propósito das contas da Parpública, surgem notícias (que não o são, porque não são novas) sobre a falência técnica das empresas públicas do sector do transportes.

A coisa, de facto, não é nova. E é de tal dimensão que levou há muito o Estado a isentar as suas empresas do cumprimento das regras por si feitas e por si impostas às demais. Sob pena de ter de as liquidar.

Juntos, os passivos das empresas públicas de transportes ascendem a muitos milhares de milhões de euros. Tantos que me atrevo a dizer que chegariam para pagar a rede de Alta Velocidade, e seguramente o Novo Aeroporto de Lisboa.

Os passivos são históricos, diz-se, e por este andar deverão mesmo passar à história. Porque não se vislumbra quem os queira resolver.

E todavia aí está um custo que, tudo o indica, iremos passar às gerações futuras, e que já hoje custa bastante a todos nós, accionistas (porque contribuintes) e clientes dessas empresas, e às próprias, obrigadas a canalizar boa parte dos recursos que geram para pagar o serviço da dívida, com isso prejudicando os investimentos produtivos e a melhoria dos serviços que é suposto prestarem.

A culpa é de todos e não é de ninguém. Vai morrer solteira. Não é, infelizmente, caso único.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Governar em campanha eleitoral

O anúncio pelo Governo de um novo conjunto de concessões rodoviárias a serem concursadas no próximo ano, a menos de um mês das eleições legislativas, é um bom caso de estudo dos limites da governação no termo dos mandatos, e da confusão que sempre se gera entre o que é actividade governativa e o que é acção politico-partidária.

Enquanto acção governativa, o anúncio de mais 820 km de concessões rodoviárias não tem pés nem cabeça. Desde logo porque se está ainda apenas no domínio das intenções - os concursos só serão preparados e realizados em 2010, depois das eleições. Mas mais ainda porque o programa das concessões rodoviárias empreendido pelo actual Executivo é tudo menos pacífico, sendo bem provável a sua reformulação, para dizer o mínimo, caso o PS não ganhe as eleições.


Felizmente, na Estradas de Portugal, encarregue de montar as novas operações, ninguém deverá mexer um dedo nesse sentido antes de conhecer o novo ministro da tutela...

Enquanto actividade político-partidária, o anúncio do Governo tem um pecado original e uma virtude assinalável. O pecado: o facto de os ministros confundirem os interesses do Governo e do Estado com os do seu partido, e utilizarem os meios de uns para beneficiarem o outro. A virtude: o ficar claro, se dúvidas houvesse, que o PS se propõe manter - e mesmo reforçar - o programa de concessões rodoviárias, caso ganhe as eleições, e apesar das críticas.
AV - e agora?

Com a crise a apertar ainda mais do lado de lá do que do lado de cá da fronteira, e alavancados pelo seu know-how na construção de linhas ferroviárias de Alta Velocidade, os espanhóis partem à frente para a concessão do primeiro troço da AV portuguesa, tendo apresentado a proposta aparentemente mais barata para os cofres nacionais.

E agora? é caso para perguntar.

Caso o PS continue governo após as Legislativas, o processo prosseguirá o seu rumo natural, tudo o indica.

E se o PSD vencer a 27 de Setembro? O que irão os sociais-dmocratas fazer com um projecto que se integra numa rede europeia, que foi negociado com Bruxelas e com Madrid, e que ainda por isso tem um consórcio "espanhol" bem colocado para vencer o primeiro "round"?

E o que pensarão agora de tudo isto os grandes grupos construtores portugueses, que têm insistido na necessidade de avançar com a AV, apesar da crise e por causa dela? Manterão ainda a sua opinião - e a pressão possível sobre os decisores políticos - mesmo ante a perspectiva de serem os espanhóis a abocanhar a parte maior da segunda fatia do "bolo"?